Pa Kua Arqueria Chinesa

Quais características fazem do arco usado na Liga internacional de Pa Kua ser um arco chinês?

Sérgio M. de Souza
5 min readMay 17, 2019

Sempre que falarmos sobre história da China precisamos lembrar que estamos falando de um país muito grande e muito antigo que já passou por diversas transformações durante a sua história. As vezes para nós brasileiros, cuja biografia documentada é bastante recente, seja um pouco difícil de compreender um país com uma história tão antiga quanto a da China. Dito isso é importante lembrar que não existe um arco canônico chinês, então quando estudamos os arcos chineses temos que ter em mente as mudanças sofridas na cultura chinesa entre uma dinastia e outra, o que provocaram mudanças nos próprios arcos utilizados em cada era.

Composto ou Compósito?

Nós temos um pequeno problema de tradução do inglês para o português em relação às palavras compound e composite, porque ambas podem ser traduzidas para composto em português. O detalhe é que a palavra composto hoje em dia, quando relacionada à arqueria, representa os arcos feitos com roldanas, portanto para se evitar equívocos, hoje é mais usual se utilizar a palavra compósito para se referenciar aos arcos que são feitos de mais de um material.

Os primeiros arcos compósitos eram feitos de diferentes lâminas de bambu ou madeira, que combinadas davam mais força ao arco do que os self bows, que eram feitos de apenas um tipo de madeira. Esses arcos começaram a ser feitos durante o período dos estados em guerra, e foram utilizados até meados da Dinastia Han (206 a.C. a 220 d.C).

O tipo de arco que fez mais sucesso na China, bem como em vários outros países asiáticos, foi o arco feito de chifre, tendão e bambu/madeira. Nesse arco era colocado o chifre por dentro, bambu ou madeira no centro e o tendão por fora. Essa forma de construção dos arcos fez com que eles pudessem ter mais potência sem precisar aumentar o seu tamanho, facilitando a mobilidade e principalmente o seu uso a cavalo.

Criação de um arco da Dinastia Ming feito com chifre, tendão e madeira (Video com cenas explícitas)

Orelhas (Siyah)

Siyahs (palavra vinda do árabe e do persa) são as seções de extremidade não flexíveis de arcos compósitos asiáticos, chamadas também de orelhas em português. Elas apontam na direção contraria às lâminas, o que dá a característica recurva ao arco. Elas também permitem uma potência maior ao tiro sem precisar puxar a corda até o seu limite, além de permitirem com que o arco tenha uma maior força mesmo sendo de um tamanho menor, o que também reduz o seu peso.

As orelhas aos longo dos anos tiveram vários tamanhos e direções, desde ângulos retos à ângulos mais fechados com a orelha apontando na direção do alvo.

A partir da Dinastia Han e até a Dinastia Yuan (206 a.C. — 1368 d.C.) os arcos com longas orelhas eram os mais populares na China.

Reprodução de um arco Han

Durante a Dinastia Ming (1368–1644) ficaram famosos os arcos com orelhas menores e com uma angulação maior do que os modelos de arcos anteriores. A versão com as orelhas menores ficou mais popular dentro da Coréia.

Reprodução de um arco Ming

Na Dinastia Qing (1644–1912) retorna os arcos com siyahs maiores e junto a popularização do uso das pontes nos arcos. Esse modelo de arco da Dinastia Qing é o mais utilizado hoje em dia.

Reprodução de um arco Qing

Ponte

Imagem retirada do livro: The Way of Archery: A 1637 Chinese Military Training Manual

A ponte foi popularizada pelos manchus durante a sua invasão à China e ficou famosa durante a Dinastia Qing. A ponte possui várias serventias, uma delas é poder ter uma maior angulação das orelhas sem a corda bater no arco. A ponte também reduz a chance da corda sair da orelha do arco e desarmá-lo além de reduzir a vibração após o tiro.

Arco de Kaiyuan

O arco de Kaiyuan (开元 弓) foi um arco desenvolvido durante a Dinastia Ming, e era de tamanho pequeno a médio e apresentava longas orelhas. Revelando a mesma potência e precisão de arcos mongóis, porém sendo muito mais leve, esse modelo se tornou o arco preferido de oficiais de alto escalão na China. Ele era feito com diferentes camadas de madeira e uma das suas características marcantes é o encaixe na orelha em forma de gancho, que possibilitava pegar as flechas do chão sem desmontar do cavalo.

Página retirada de manual militar

Os arcos usados na Liga Internacional de Pa Kua

O arco padrão da nossa escola possui orelhas de tamanho médio com uma angulação mais fechada, se fazendo necessário o uso da ponte. O seu corpo hoje em dia é feito de material moderno chamado fiberglass (Polímero reforçado com fibra de vidro), além de possuir uma empunhadura tradicional que possibilita o tiro ambidestro.

Outro arco muito utilizado na Liga Internacional de Pa Kua é o famoso arco Kaiyuan. (detalhe para o gancho na orelha)

Além desses arcos, é comum os recintos de Pa Kua disponibilizarem modelos mais simples para os alunos iniciantes, normalmente com uma libragem menor e sem todas as características de um arco chinês. Isso também se dá à dificuldade de adquirir arcos chineses em determinadas regiões ou países, como no Brasil onde a prática ainda não é popular como em locais da Europa e Ásia.

Fontes e material para estudo:

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Sérgio M. de Souza
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Written by Sérgio M. de Souza

Praticante e professor na Liga internacional de Pa Kua

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